Até a chegada da televisão, o rádio foi o pioneiro no entretenimento doméstico, alcançando seus anos dourados em meados das décadas de 30 e 40, onde os programas de auditório, novelas, seriados policiais e as grandes canções eram transmitidas por meio deste veículo de comunicação que reunia toda a família em torno de si. É em torno desta realidade que Woody Allen produz um de seus trabalhos mais belos, intitulado Radio days.
Produzido em 1987, Radio days (ou A era do rádio, como é chamado aqui em terras brasileiras) apresenta Woody Allen como o narrador, em voz off, que se debruça em uma profunda nostalgia, apresentando a sua infância na figura de um personagem que vive num subúrbio envolvido ao glamour dos programas de rádio, e em meio ao mundo em período da Segunda Guerra. Integrante de uma agitada família de judeus, o garoto passa pela experiência de observar cada integrante e suas respectivas experiências com a sedução que as programações radialísticas proporcionavam.
O diretor explora desde o princípio do filme a intensa relação do indivíduo com o meio de comunicação mais influente da época; o longa inicia com um assalto domiciliar, onde uma dupla de invasores são surpreendidos com uma ligação dentro da própria casa. Ao atender, encontram-se em meio à participação de um programa de auditório exibido via rádio. Neste exato momento, os bandidos esquecem seu “trabalho” e se entregam à adrenalina da participação do jogo de perguntas e respostas que concorrem a prêmios. Woody Allen conduz o espectador por meio de seu roteiro que, de uma maneira cômica, explora o contato do homem com o principal meio de comunicação de massa. O rádio é o personagem principal do filme; é ele quem determina as reuniões de família, é com ele que a figura masculina se comunica, por meio dos programas de esportes, assim como a mulher diante às radio novelas, ou os casais perante os conselhos amorosos e as garotas jovens que se deleitam à sedução dos cantores e suas belas vozes.
Woody Allen não deixa de relacionar às suas memórias eventos veiculados pelo rádio durante a Segunda Guerra Mundial. Ele como garoto americano ouviu muitas histórias da guerra e a participação de seu país. Foi pelo rádio que todos os americanos ouviram do presidente a entrada da nação na guerra. Algumas das “histórias” anunciadas procuravam apresentar os alemães e japoneses como vilões. Era pelo rádio, também, que todos tomavam conhecimento do número de soldados mortos e feridos, as batalhas vencidas e perdidas e muitos outros fatos. É perceptível a mudança da programação dos programas após o atentado de Pearl Harbor, dando prioridade às vinhetas de caráter político, enaltecendo o poderio norteamericano perante o mundo, bem como recrutando jovens para o serviço militar.
O filme – além de apresentar um cenário que remete o espectador à vida dos grandes centros norte americanos, conduzindo às iluminadas noites das grandes festas e eventos culturais, capricha também, em sua trilha sonora, privilegiando as canções famosas daquela época. O Brasil, inclusive, é representado pela da atriz Denise Dumont, que atua numa ponta como uma cantora latinoamericana interpretando a cancã “Tico-tico”, e pela cena onde os personagens dançam South american way, da Carmen Miranda. Diana Keaton aparece belíssima, cantando You'd be so nice to come home to.
Radio days é um filme encantador, que possui uma sincronia entre o cômico e o drama dos personagens na busca pela fama, pelo amor eterno, e pelas experiências da infância diante de uma sociedade que buscava esquecer as tensões de uma conjuntura absorvida pela Guerra. Woody Allen se mergulha no personagem que é o alterego de sua infância, e recolhe os fragmentos de suas memórias enaltecidas pelos anos dourados dos programas de rádio.
Nota: 5/5
A era do rádio
Título original: Radio days
Ano: 1987
Direção/Roteiro: Woody Allen
Elenco:
Martin Rosenblatt
Helen Miller Julie Kavner
Julie Kurnitz
David Warrilow
Michael Tucker
Josh Mostel
Renée Lippin
Trailer
2 comentários:
Oi Clyde,
Parabéns pelo blog! Adorei o seu texto e você escreve super bem. Eu não assisti ainda Radio Days, mas pela sua resenha, fiquei curiosa de ver o efeito do rádio sobre as pessoas. O rádio perdeu tanto espaço para a pobre televisão hoje em dia, que esse filme de Woody Allen deve provocar um certo saudosismo de como essa forma de comunicação é uma das melhores do mundo.
Bj
MaDame Bonnie
Oh, minha encantadora Bonnie, suas palavras são encantadoras. De fato, Woody Allen nos conduz, por intermédio deste filme, a experiências não vividas, compartilhando conosco de seu sentimento nostálgico.
O filme é lindo. Divertido e comovente.
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