segunda-feira, 18 de julho de 2011

If: Da castração escolar à rebeldia de 68.


As grandes escolas foram construídas como um ambiente que proporcionasse a formação do sujeito por excelência, vislumbrando a construção de um homem intelectual e cumpridor dos bons costumes. Mais conhecidas como academias, estas foram destinadas aos filhos de famílias tradicionais burguesas e mantinham-se estruturadas numa educação tradicional, onde o professor era o portador do conhecimento que seria passado ao aluno por meio da repetição dos conteúdos, além do ensino voltado à moral e aos valores cristãos, onde os alunos eram submetidos à disciplina e sujeitos a punições, caso violassem a boa conduta imposta na instituição. Tais características serviram para a construção do roteiro do filme “If...”: provocante e subversiva obra, a qual foi produzida na efervescência cultural e política de 1968, e dirigido por Lindsay Anderson.

Vencedor de prêmios, “If...” é uma obra que retrata a era da rebeldia em que a juventude vivenciava no fim da década de 60, onde acreditavam na revolução cultural e rompendo com as estruturas sociais mantidas pelos regimes de opressão moralista e burguesa. No filme, o roteiro parte do espírito subversivo dentro dos muros de uma conceituada escola privada britânica que sempre se manteve alicerçada na manutenção do tradicionalismo, na moral, na educação amparada pela doutrina cristã, e pela predominância do poderio da classe burguesa. A hierarquia é mostrada neste filme, e é presente entre os próprios alunos onde aqueles que são escolhidos como monitores – geralmente os mais velhos – são encarregados de manter a ordem na escola, reprimindo os seus colegas; possuem os alunos mais novos como subordinados e estes, por outro lado, são dispostos a servir a seus superiores, sendo punidos caso cometam qualquer ato de desobediência.

O primeiro plano de “If...” é uma passagem bíblica de Provérbios, 7:4, que possui o seguinte escrito: “A sabedoria é a coisa principal; adquire, pois, a sabedoria; sim, com tudo que possuis, adquire o conhecimento”. Logo a seguir, há um corte onde já mostra a escola vista de fora, em plano largo, acompanhada de um canto gregoriano e intercalado por risadas eufóricas de crianças, finalizando com um longo silêncio. Lindsay Anderson pontua sempre no filme a predominância da doutrina cristã e a disciplina austera e silenciosa como metodologia para alcançar a sabedoria. Outro destaque do diretor são as repletas pinturas de filósofos nos corredores da escola e em salas de aula, e as ações repressivas e moralistas dos superiores para com os alunos, revelando uma contradição entre o desejo pelo conhecimento no campo das idéias e a manutenção do conservadorismo em prol dos bons costumes, na prática. Anderson procurou, ainda mais, dividir o filme em capítulos onde cada título é uma palavra-chave às características da escola e suas respectivas doutrinas.

O roteiro assemelha-se a filmes anteriores, como Os incompreendidos (França, 1959), que também traz uma escola que mantém um currículo tradicional, predominando a disciplina e a punição dos alunos rebeldes como forma de ensinar-lhes o caminho da moral e do saber. O sistema repressivo dentro do espaço escolar é evidente dentro dos filmes de Truffaut e Anderson, e esta repressão era justificada como uma educação para o homem de bem. Os dois diretores, também, se preocupavam em revelar esta educação ameaçada por seus protagonistas que iam de encontro a esta estrutura vigente. Em “If...”, o movimento rebelde dentro da instituição é liderado por Travis (personagem que revela o ator Malcolm McDowell, que mais tarde estrela em Laranja Mecânica), que considera a estrutura repressora da Academia como a verdadeira inimiga. O protagonista, junto aos seus companheiros, cria um espaço alternativo dentro da escola de elite: enquanto a escola é cercada por pinturas de homens inalcançáveis, o quarto de Travis é rodeado por imagens de homens que foram protagonistas de um cenário revolucionário. Para o protagonista “a violência e a revolução são os únicos atos puros.” Enquanto a escola possui um currículo em que predomina o preenchimento do aluno pela reprodução de conteúdos do professor, os rebeldes se educam com discursos revolucionários, sobre a quebra da moral e hipocrisia e discursos sobre a vida e a morte.

Durante toda sua narrativa “If...” denuncia um sistema escolar repressor e implacável, visando uma reprodução de um sistema dominante fora dos muros da escola. A didática de ensino, a metodologia moralista e a castração do livre pensamento partiam do pensamento dominante da época em que a história era narrada; dentro dos muros da escola, o aluno era adestrado a ser um receptor, a cumprir tarefas em horas contadas; não se considerava a diversidade do sujeito, seus desejos, sua sexualidade; esta, inclusive era um fator presente nos monitores que cobiçavam os seus subordinados, na maioria das vezes calouros que estavam adentrando nos primeiros anos da adolescência. Em “If...” a escola, reproduzindo o modelo social predominante, sufoca o aluno, desconhece suas necessidades, suas carências, não ampara as suas angústias; ao contrário: pune, castiga, reprime. Esta ausência de amparo e de uma válvula de escape é o estopim para o despertar de uma revolta, por parte dos subversivos, levando o sujeito a voltar-se contra a instituição em que se encontra.

“If...”, então, foi um trabalho ousado de um Anderson, como diretor, entregue à efervescência cultural de 68, antecipando o momento revolucionário. O roteiro produzido por David Sherwin e John possui a coragem de abrir as portas do sistema educacional da época, e os instrumentos que impediam a verdadeira emancipação do homem por meio do conhecimento. O filme denuncia a instituição que mantém a educação e manutenção da classe burguesa e enaltece uma minoria que sai desta classe e se torna sua inimiga. “If...” é, sem dúvida, um manifesto de denúncia contra um sistema que reprime a educação e emancipação do ser humano.

Ficha:

• Título Original: If…
• Direção: Lindsay Anderson
• Roteiro: David Sherwin, John Howlett
• Gênero: Drama
• Origem: Inglaterra
• Duração: 111 minutos
• Cor: Colorido

Trailer:



2 comentários:

Anselmo disse...

Quero ver o filme.... kkkk... Amei o texto. Voce esceve deliciosamente bem, como já comprovei desde a primeira vez que acessei seu blog... so nao demore tanto pra escrever...

Alexandre Alves disse...

Ow Anselmo... Tenho q aprender tanto rsrsrs. Confesso q o filme me inspirou muito, e foi bem com o intuito de desenvolver um artigo em cima desta obra.
Como foi atingida a intenção de despertar a curiosidade pelo filme, agradeço pelo elogio, e prometo ser mais fiel às postagens heheheh