terça-feira, 22 de abril de 2008

Pontos de Vista : "O Velho e o Moço."


Sentado num banco daquela praça, lá estava aquele velho homem cumprindo seu típico ritual de alimentar os pombos. Sua expressão apática parecia não se importar com mais nada que se relacionava com a sua existência; trajando seu velho moleton desbotado, parecia aguardar a Dama Morte a fim de cumprir a única certeza humana.

De onde eu estava pensei que ele apenas alimentava os pombos como um mero passatempo. Jogou, pois, mais um punhado de alpiste, e sorriu. Tal expressão de afeto, ou não, me deixou transtornado. Não me perguntem por que, uma vez que sentimentos não são explicados, por isso minha crise diante deles.

Enfim o velho notou minha presença e me convidou para sentar próximo a ele, como quem queria iniciar algum diálogo. Não possuia, e não possuo, o hábito de conversar com idosos; talvez por não preferir as dicas pré- fabricadas de sobrevivência daqueles que há muito tempo permanecem em vida. Tive o receio, mas minha ânsia falou mais forte e me aproximei.

O calor da tarde deu espaço para que sentisse um frio psicológico; passei a notar a melancolia enrugada naquele rosto esculpido pelo tempo e pelas ausências que experimentara. Sentado no banco da praça, lá estava ele e eu: dois pontos de vista diferentes sobre o mundo, encarnados em contextos diferentes.

Ele possuia um semblante sofrido, angustiado, como se a dura realidade fosse sua mãe por um bom tempo; ou talvez algo que ele esculpiu à sua imagem e semelhança. Talvez não tenha sido um bom filho, um bom pai, um bom avô, e tenha recebido como castigo dos céus a essência opaca, e a observá- la naquele lugar.

Não conversamos nada, apenas observàvamos os pombos. Passei a me enxergar nele e ver séries de futuros alternativos; ele me olhava e tinha sensações nostálgicas, de tentar alcançar a juventude esquecida. O velho e o moço.

Voltando à realidade, imaginei que nada mais existia além de pombos, alpiste e duas sombras esquecidas no meio do outono.

domingo, 20 de abril de 2008

Além do desespero, o saudosismo.




O homem é um animal tolo; acredita ser feliz quando não se conhece. Prefere viver fechado em seu casulo abafado a experimentar a dor de encontrar vias que favorecem a capacidade de pensar. Talvez falta coragem, como aquela de Adão e Eva que preferiram uma via crucis, mas livre, realmente livre, a viver naquele paraíso comodo e infantil, criado pelos homens com a finalidade de sustentar o destino da humanidade em viver como marionetes de Deus.


Aquele livro que outrora me levava a outros estilos hipócritas de vida já não me motiva mais. A sede é intensa; quero saciá- la. Qual homem não possue a sede de liberdade, por mais infame e transcedental ela seja?


Digo que Eva lutou por isso; Pandora também, e todas aquelas que procuraram em toda sua vida mitológica libertar nós homens de nossa existencia pacata. Admiro as mulheres por isso; talvez pelo fato de darem não à luz, mas livrar suas criaturas de um universo cômodo interior, mesmo que depois eles recaem numa sede alienada por seus deuses esculpidos em pedras e mentes.


Bom, já comecei a aceitar que a mudança ocorre quando menos espero; um algoz me dá constantemente reações de ânimo, e pelo calor que escorre do sangue percebo que ainda estou vivo.

sábado, 19 de abril de 2008

Se minhas palavras não são o bastante
Você pode abrir meu peito e com uma faca cortar meu coração

Mesmo que eu não tenha percebido
Suas desculpas e incertezas

Algum dia eu odiarei alguém assim outra vez?
Nesse caso, então lhe abraçarei cada vez mais
E você poderá perfurar meu coração como um estilhaço
Contanto que eu possa permanecer eternamente em suas memórias.

Devaneios em um bar


A musica o envolvia; era somente ela e aquele sentimento de desapego que envolvia seu ser. A xícara com o resto de café esquecido pendia na ponta da mesa, numa tentativa de suicídio. Ele não se importava mais, senão com aquela canção que emanava daquele jukebox, preenchendo a essência daquele bar.

Recostado na mesa nada mais lhe importava; seus contos inacabados em folhas sujas de um caderno velho ganhava influencia daquela canção, triste cúmplice da perda que sofrera naquele verão.

Aquele universo, meramente paralelo, entre contatos triviais, típico dos jovens da época, fazia dele amante daquela caixa que Pandora um dia lhe presenteara. Dejà vus constantes eram frutos daquela sensação perdurante.

Futare no Kage era seu nome; o nome da triste canção que o fez sorrir com o rosto sobre a mesa, enquanto lembrava daquela mulher que um dia o amou, mas preferiu cair nos braços da dama morte.

Humanidade.
A criação que cria.
A criação que pensa.
A criação apegada e desapegada simultaneamente ao seu "criador".
A criação distorcida, inacabada, pragmática.
A criação dúbia e contraditória; autêntica e hipócrita.
A criação que cria religiões para sobreviver , e finaliza sua existência num cemitério de cruzes.
A criação que cria deuses a fim de afogar suas crises num mundo caótico.
A criação divina.
A divindade que foi criada.
A criatura que questiona.
A criação que não se responde.
O café amargo e frio lhe arranca uma careta, semelhante àauelas escondidas entre seus sorrisos falsos. Auto punição era sua identidade; costumava carregar seus estigmas abertos apenas pelo simples aceitar de um castigo merecido por ser livre.

Liberdade... sentimento materializado utopicamente na lança cravada no peito do subversivo crucificado. Assim como o amargor excitante do café, arrancou dolorosamente os pregos que lhe prendiam naquele madeiro; despencou e sentiu que o chão, o qual lhe convidava a caminhar independentemente.

A luz vinda do horizonte no fim da madrugada cegava os olhos daquele cuja vida estava moribunda em crenças triviais. E naquele momento, descobriu que sua fé é tão solúvel e amarga quanto aquele café.